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Etiqueta: monaquismo

Arquimandrita Placide Deseille (1926-2018) – estágios de uma peregrinação

I. Os primeiros estágios (1926-1942)

 Anos de formação

Lembro-me de todos os que contribuíram para a minha educação humana e espiritual com profunda gratidão; a começar pela minha família. Fui formado na escola da grande tradição litúrgica e patrística da Igreja. A minha avó e as minhas duas tias paternas, que muito me influenciaram, tinham como leituras de cabeceira o Livro de Oração Antigo de Dom Cabrol e o Ano Litúrgico de Dom Guéranger, livros que continham textos esplêndidos das antigas liturgias do Ocidente e do Oriente.

Essas três mulheres eram animadas por uma fé viva e uma profunda piedade, desprezando quaisquer devoções sentimentais. Desde muito cedo, souberam dar-me um sentimento e um apreço pela riqueza da Tradição. Elas também amavam a vida monástica e as obras de Dom Marmion; sendo que as grandes abadias de Beuron, Maredsous e Solemnes [1] eram os lugares elevados do seu Cristianismo. Na escola secundária, os meus professores jesuítas – homens de oração e inteligência, de uma grande nobreza de coração – despertaram em mim o amor pela Antiguidade Clássica, pelo cavalheirismo da Idade Média, e também pelo século XVII em França. Eles não se opuseram, de forma alguma, à influência da minha família.

Eu devia ter uns doze anos quando li, numa revista já bastante antiga, um artigo sobre os mosteiros de Meteora, na Tessália, ilustrado com fotografias evocativas. Fiquei profundamente impressionado e senti que, naquelas regiões, existia uma tradição ainda mais venerável, mais autêntica, do que as grandes abadias beneditinas contemporâneas das quais a minha avó sempre me falava. Eu teria apreciado muito tornar-me um monge no Grande Meteora – mas, obviamente, essa era uma esperança impossível. Eu não podia sequer conceber que, um dia, fosse aceite num mosteiro católico, pois parecia-me sublime e inacessível o modo de vida que ali se praticava. Eu esperava por um outro futuro.

A guerra de 1939 e a ocupação alemã alteraram duramente toda a minha vida. Tive a oportunidade de ir muitas vezes à Abadia de Wisques, no Pas-de-Calais. Lá conheci um monge maravilhoso, Dom Pierre Doyere, um ex-oficial naval que tinha entrado nesse mosteiro e que, mais tarde, tornou-se o seu prior. Permaneci sempre muito afeiçoado a ele, assim como ao Padre Abade, Dom Augustin Savaton. Quinze anos depois fui convidado a colaborar com Dom Doyere na edição, para a série Sources Chrétiennes, das obras de Santa Gertrude de Helfta, uma grande mística beneditina do século XIV.

Encantou-me a figura de São Francisco de Assis e as dos seus primeiros companheiros, as quais descobri através das obras de Joergensen [2] e do Fioretti [3]. Contudo, mais tarde, o franciscanismo não exerceu nenhuma atração sobre mim. Visitei algumas abadias beneditinas, em particular a de Solemnes. A esta última voltei com frequência, sendo que ela permaneceu para mim, ao lado da Grande Trappe, como uma espécie de segunda pátria espiritual. No entanto, se por um lado, a vida beneditina me atraía por estar enraizada na tradição, por outro, não satisfazia uma certa necessidade do absoluto, um gosto por uma espécie de rudeza na existência e um primitivismo evangélico, qualidades que encontrei simbolizadas pelos eremitérios franciscanos da Úmbria e pelos mosteiros de Meteora.

EXORTAÇÃO DE SÃO PACÓMIO ACERCA DO RANCOR DUM MONGE

O venerável Pacómio, nascido em 292 d.C., de uma família pagã, converteu-se ao Cristianismo quando contava com 20 anos de idade, tendo recebido uma educação ascética. Em 320, fundou o seu primeiro mosteiro em Tabenesi, na Tebaida (Alto Egito), dando início ao vida monastica cenobita (comunitária), que perdura até os nossos dias. Morreu em 346, deixando como obras a Regra Monástica (com 194 artigos), diversas exortações aos seus monges e 11 cartas a abades e irmãos religiosos.

Nesta página, apresentaremos uma das suas exortações aos monges, que trata do perigo do rancor. Como é sabido, os primeiros monges isolavam-se no deserto. Com Pacómio, surgiram as primeiras comunidades de monges, as quais se caracterizavam pela partilha total dos bens, pela oração comum, pela observância à mesma Regra, pelo trabalho manual e pela obediência absoluta ao abade.

Agradeço ao nosso tradutor voluntário, José Carlos Romano, pela generosidade em traduzir este texto. Sem a sua valiosa colaboração, este maravilhoso texto não estaria disponível a todos nós. Que Deus o guarde e o proteja!

Exortação pronunciada pelo nosso, mui venerável, Santo Padre Pacómio, o santo arquimandrita, por motivo dum irmão que guardava rancor contra o outro. Nos tempos do abade Ebonh, que havia levado aquele irmão a Tabennesi, [Pacómio] dirigiu-lhe estas palavras, na presença de outros padres anciãos, para a sua grande alegria, na paz de Deus!

Desçam sobre nós as suas santas bênçãos e as de todos os santos! Que todos possamos ser salvos! Ámem.

Monja Rebeca – Monge: “O Asceta do Amor”

“O impulso que produziu o voo original para o deserto tebático do Egito (Thebaída) foi […] o impulso elementar do Cristianismo, que tudo desperta para Deus, abandonando todas as coisas e influências deste mundo a fim de melhor se preparar para o Reino dos Céus”.   Hieromonge Serafim (Rose)

O monaquismo encarna a mais elevada forma de vida ascética da qual o homem dispõe para corresponder ao amor louco de Deus, que deseja ardentemente divinizá-lo, a fim de torná-lo semelhante a Si próprio. O homem torna-se, então, segundo São Máximo, o Confessor, um pequeno “deus”, ao possuir todas as qualidades do próprio Deus: a mesma glória, a mesma beatitude, a Ele idêntico em tudo, menos na essência.