Pergunta: Reverendíssimo padre Pedro, explique-nos, se faz favor, se a Igreja Ortodoxa aceita o divórcio e o novo casamento e em quais condições? Como é rompido, neste caso, o vínculo do primeiro casamento e que relação espiritual restará entre os cônjuges após o divórcio ou a morte?
Resposta: A questão é muito séria e delicada e a interpretação e a aplicação dos princípios bíblicos ligados ao casamento, muitas vezes, são feitas tendo em conta as paixões humanas e não a vontade divina. O tempo não me permite fazer uma análise completa da doutrina da Igreja sobre este tema, mas tentarei sistematizar as seguintes ideias:
1. O casamento é a união sagrada entre um homem e uma mulher, os quais assumem, livre e responsavelmente, o caminho da salvação através do amor, da ajuda mútua e da procriação. Para este efeito, a Igreja abençoa o casamento e cada cônjuge (crente, fiel e consciente) recebe o outro como um dom de Deus e como uma “metade sua”, sem a qual não se sente realizado. A Igreja chama e ajuda os esposos a superar as paixões e a espiritualizar o amor mútuo e, assim, os casamentos feitos por impulsos viciosos, por interesses ou obrigações não recebem a bênção de Deus, pois somente pode haver o amor verdadeiro onde houver a liberdade (tanto física e jurídica, como sobretudo espiritual, com relação aos vícios e às paixões).
2. O casamento é considerado um ato único e irrepetível, que só é quebrado pela morte de um dos cônjuges (Romanos 7:2-3). Quando São Paulo nos diz que “é melhor casar-se do que ficar abrasado” (I Coríntios 7:9), refere-se à viuvez e às mulheres que nunca foram casadas (I Coríntios 7:8) ou às que, estando casadas, deixaram os seus maridos adúlteros, sem que elas próprias tenham cometido adultério; porque, de outro modo, isso contradiria um outro texto bíblico (Mateus 5:32). O mesmo princípio é válido no caso dos homens e as especulações que dizem que aos maridos seria permitido mais do que as mulheres é totalmente errado. Consequentemente, o segundo casamento é aceito pela Igreja somente para as pessoas viúvas (geralmente, um ano após a morte do cônjuge) e para os que ficarem sozinhos depois que o marido (ou a esposa) tenha abandonado a sua família, ao pecar com outra pessoa. O segundo e o terceiro casamento são vistos pela Igreja como uma exceção que pode ser tolerada, no máximo, duas vezes (além do primeiro casamento) e a sua aprovação, pela Igreja, vem acompanhada pelo afastamento da Sagrada Comunhão (o Sacramento) de dois a cinco anos. Mais do que isso, o terceiro casamento é admitido apenas se a pessoa em causa não tiver atingido os 40 anos de idade e não tiver filhos. Na Igreja Russa e, parcialmente, na Grega, a dispensa para o segundo e o terceiro casamentos é dada pelo hierarca da diocese e, na Igreja Romena, pelo pai espiritual. Infelizmente, existem poucos casos nos quais os pedidos de divórcio e segundo casamento são seriamente examinados conforme a doutrina da Igreja (baseada, obrigatoriamente, nas Escrituras).
3. Na minha opinião, abençoar os casamentos ilegais não significa, de forma alguma, uma saudação de boas-vindas e um incentivo ao arrependimento, mas somente um encorajamento ao pecado e ao divórcio. A Igreja não pode e não tem o direito de abençoar um casamento baseado no adultério (inicialmente, era-se um amante, vindo a tornar-se, depois, esposo/esposa). Então, se um homem e uma mulher se tiverem divorciado (por diversos outros motivos, que não o adultério) e somente após um período se conhecerem e queiram-se casar, a Igreja pode abençoar este casamento (mesmo assim, como uma exceção, não como uma regra). Mas, se alguém, ao estar casado, tiver encontrado um/uma amante e, apenas depois, se tiver divorciado, solicitando o Casamento com o “novo parceiro”, este deve ser recusado. O padre deve analisar muito bem a situação, para evitar profanar os Sacramentos da Igreja e se, por negligência ou pelo desejo de ganhar dinheiro, ele aprovar um casamento deste tipo, devemos dizer, claramente, que o Casamento não é válido (independentemente do luxo da festa ou do dinheiro gasto).
Nesta situação, existem muitas irregularidades e os que se divorciam e tentam legalizar juridicamente um adultério devem entender que, religiosamente, o mesmo não pode ser legalizado de nenhuma forma. Não deve haver exceções, nem para os políticos, nem para os benfeitores da Igreja, pois os mandamentos divinos têm a mesma força para todos e não significa que, depois dum casamento desses, que é puramente formal, a relação dos que vivem em adultério passará de pecado para bênção. Certamente que não! Um Casamento assim não é válido, mesmo que feito ou aprovado pelo Patriarca. E quando alguém solicita a bênção dum relacionamento pecaminoso (baseado em adultério), nós não lhes devemos dar falsas impressões e ilusões, mas chamá-los ao arrependimento e à abstinência. Não nos esqueçamos que os que cometeram semelhantes infâmias pedem o Casamento somente para tranquilizar a sua consciência e não porque estejam sentindo a necessidade da bênção de Deus, sabendo muito bem que Deus os abençoou no primeiro Casamento e que Ele não muda a Sua vontade e bênção sem razão, seguindo os costumes mundanos dos devassos. Sim, os que vivem assim não devem beneficiar nem do Casamento, nem da Comunhão, nem do funeral, até deixarem o pecado, independentemente de poderem refazer o primeiro casamento ou não. Chegamos à conclusão que a aceitação dum divórcio na Igreja não significa (ou não deveria significar), também, a autorização automática para um novo casamento.
4. À questão sobre a relação dos cônjuges depois da morte, responde-nos o próprio Cristo ao destacar que, no Reino de Deus, não há mais maridos nem esposas, mas que todos são como os anjos do céu (Mateus 22:30). Lá, não há diferenças entre os sexos, como também não há diferenças entre os anjos, mas todos são iguais. Por outro lado, conforme os textos bíblicos e patrísticos, podemos concluir que, no Reino de Deus, todos estarão numa comunhão completa, independentemente de terem sido ou não parentes na terra; e, no inferno, todos estarão numa alienação completa, ainda que, na terra, possam ter sido muito próximos. Não é excluído também que um dos esposos vá para o céu e o outro, para o inferno; por isso, sobre uma continuidade das relações familiares no outro mundo não podemos falar ou, pelo menos, não temos base bíblica ou patrística para o fazer.
Peço desculpas pela resposta sumária, mas espero que ela possa contribuir para resolver a situação, pois a facilidade com a qual a Igreja aprova o segundo casamento é mesmo alarmante e perigosa. Não temo afirmar que muitos desses casamentos nem mesmo são válidos. Da mesma forma podemos dizer que, quando um casal se casa pela primeira vez, não com fé e consciência e sim em virtude dum costume mundano ou por causa de uma sessão de fotos dentro da igreja, o Casamento não deveria ser válido. Não no sentido em que deveria ser repetido (eventualmente, por um padre “melhor”), mas no sentido em que ele não tem efeito nenhum se não for um ato consciente e sustentado por um modo de vida adequado. Efeitos mágicos e mecânicos na Igreja não existem e, graças a Deus, nem podem existir!
Tradução: Ioana Andreea Lazăr e Gabriela Mota